Physics of Gridlock - Pain of Salvation

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Sardónico

Sorri-te lágrimas,
o que tinha em mente.
Sorri-te o todo
insuficiente,eternamente.

Sorrisos pálidos,
de olhos vagos.
Sorrisos ávidos,
sonhares pagos
ao preço do sol.
Sorrisos que tenho,
sorridos do que não tenho,
sorrisos presos,
agarrados ao meu cenho.

Sorri-te o mundo,
o azul e o profundo.
Sorri-te a vida,
vívida ou vivida,
encontrada e perdida.

Sonhos meus,
de sorrisos teus.
Um sorrir breve,
eterno e leve,
de viver apenas.
Sorrisos que tive,
Sorrisos que não retive,
sorrisos idos,
sorrisos que não detive.

"Prodigal" , In Absentia , Porcupine Tree

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Balada

Sem compassos para o nada,
sou um tempo vazio.
Canto a minha melodia aguada,
o meu olhar frio
sobre ti,
sobre tudo o que vi,
e sobre a vida
perdida
de um louco
a quem sabe a pouco
saber tão pouco.
Sinto-te a fome e a sede,
bebo-te o sangue
e o medo,
por baixo da pele,
e bem cedo
te tomo as dores
e os rubores,
deixo-te a sós contigo.
Tal como um dia
fiz comigo.

"Eternamente tu" , Bairro do amor, Jorge Palma

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

É fácil,através de uma leitura "na diagonal" deste blog,saber que não tenho por hábito falar de concertos.Mais:sendo este um blog declaradamente de poesia,prosa etérea e afins,jamais será o espaço adequado para fazer qualquer menção a um evento semelhante.

Mas há magia e poesia em coisas nenhumas que são tudo no momento.

Os grandes concertos da minha vida foram períodos de tempo em que sorri com bastante frequência.

Porcupine Tree foi um gigantesco sorriso.

Obrigado eu,Steven.Obrigado eu.

"Normal", Nil Recurring, Porcupine Tree

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Medium

Como inspirado,
soprei.
Signo somado,
multipliquei,
e subtraí-te, comunicado,
o ar que te dei.

Como combinado,
olhei.
Imaginário domado,
soltei,
e prendi-te, livre acorrentado,
o legado que te deixei.

Como sonhado,
saboreei.
Palato assombrado,
suspirei,
e engoli-te em seco, molhado,
o prazer que alimentei.

Como ponderado,
pensei.
Odor emanado,
solucei,
e senti-te a fragrância no fado,
o cheiro que cantei.

Como chorado,
parei.
Toque desejado,
recusei,
e toquei-te o fundo, magoado
do assalto com que o tomei.

"Open Car" , Deadwing , Porcupine Tree

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Serventia cega

Passaria o mundo a pente fino,
Naquele que era o momento
Perdido entre o fumo sem tino
E o tormento
De seguir a tua
Ira divina para a rua.
Carregaria em ombros
A tua estátua de mármore,
Colosso de escombros.
Plantaria a tua árvore
Nas praças do mundo,
Raíz do medo profundo
Do amanhã e depois.
Acenderia uma vela por nós os dois,
Pintaria numa tela o que sois,
O que foste e sereis,
Rei dos reis,
Dos ídolos em ruínas.
Adorar-te-ia, Deus que em ti começas,
Homem que em mim terminas.

"Jotun" , Whoracle , In Flames

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Corrente

Deixei-me levar no bocejo,
ensaio leve do desejo
de acordado me manter
para me ver adormecer.

Deixei-me levar pela sensação,
precipitada conclusão,
de que no dormir me revejo,
quando negro sinto e negro almejo.

Deixei-me levar pelos ventos,
de mudança sibilada entre dentes,
quando a revolução se grita
e o débil silêncio dos tempos se evita.

Deixei-me levar pelo crepúsculo,
sombra do ser sem músculo,
penumbra sem certeza,
que me faz do tempo presa.

"Segue-me a luz" , Bom Dia , Pluto

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Galé

Dei-te a mão,
na falésia.
O nevoeiro trouxe-te fresca numa canção
de brisa e maresia fria,
na senda macia
de um ser mais forte.
Tomei-te ondas
por abraços de anjo,
ondas vindas
do querer e do desejo,
de um sabor de mar.
Atraído pelo rugir
ao luar
do teu corpo por tocar,
da tua vida por sentir,
adormeço sem pensar
e sem ouvir
a voz que me embala
no berço do teu sal.
Acordei nas novenas
do imaculado areal
para uma vida sem falésia,
e sem asas,
sem inércia.
A falésia já lá vai...

Silêncio das marés

terça-feira, 8 de julho de 2008

Áquem e além dor

Sou de mim no vazio,
sou teu no frio
e no estio,
não sou de ninguém.
Sou de cêra
para alguém,
de sonho parecera
a alguém mais além.
Sou uma fraude,
cego e surdo,
sem toque de ouro e mudo.
Sou um velho lobo,
cansado mas astuto.
Cedo roubo
a vida a um qualquer cordeiro,
fascinado pelo verdadeiro
uivo de um sonho.
Sou pobre mas risonho,
o meu único trunfo.
Arauto e vítima
no meu próprio triunfo,
faço meus os sonhos de Deus,
de Deus nos sonhos e nos sonhos dos meus.
Sou meu próprio Deus,
pelo suicídio da criação.
Vôo largo,
pela sua mão,
e desço ao largo
do inferno da paz e redenção.

"At tragic heights" & "Scorpion flower" , Night Eternal , Moonspell

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Fadiga

Aqui.
Onde os fracos perecem,
os homens desfalecem,
e os heróis de outrora
tropeçam.
A anos luz da aurora,
no lugar comum
do aqui e agora,
onde as pernas tremem,
no sentir que os homens temem.
Onde tudo foge,
tudo corre,
tudo,tudo,tudo morre.
Onde os olhares se perdem,
as vozes emudecem
e as vidas desvanecem.
Quando o sofrer
entra a doer,
implora para morrer,
cego,sem poder!
Para lá das cores
e das dores,
dos medos e pavores,
dos ácidos sabores
de sangue e suor,
a dúvida maior:
será fado,
estar sempre cansado?

"No more tears", Live&Loud, Ozzy Osbourne

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Insónia

Não há sonhos.
Nada para me assaltar,
sono por que esperar.

Já é tarde!

Silêncio

terça-feira, 1 de julho de 2008

Escrita sem dia

Guardei a tua carta.
A tinta farta,
a letra decidida,
acometida
por (entre)linhas
tortas, como as minhas.
A semântica tímida,
escondida
entre os meus olhos
e o teu coração,
entre os sonhos
e a razão.
A saudade
de quem parte
á vontade,
por essa folha sem arte,
para escrever o que pensou,
o que um dia se dirá que mudou.
A saudade sem medo,
convicção,cego credo,
que o logo
chega cedo
e não fica cá.
Se me escreves de lá,
de onde me esperas,
se não exasperas
pelo viver que te criou,
é porque és as quimeras
do ser quem sou.

"Cartas de amor", Quarteto moderno

segunda-feira, 30 de junho de 2008

Desconforto

Deitei fora as esperanças
no calor dos muros.
Medi bem-aventuranças
em silêncios duros,
difíceis de quebrar,
interessantes de ouvir.
Prestes a sorrir,
pensei a sorte,
hipótese forte,
de te ver fugir.
A sedutora imagem
de agarrar,na margem
a mão dos idos,
os olhares perdidos
e decaídos,
surge pálida
e cálida.
Aconchegante,
mas sem fulgor.
Prestes a dormir,
pensei a morte,
hipótese forte,
de te ver partir.
A derradeira imagem,
barco que parte da margem
dos chamares perdidos
e decaídos
surge difícil
e inverosímil.
Certa e inevitável;
porque débil
sou eu.

Silêncio

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Platónico

É como ver-te passar na rua.
Ver-te morder o lábio
entre a nua
incerteza e o gáudio,
pelo meu interesse.

É como sonhar-te no suor frio.
Acordar molhado
no calor do estio,
sem te ter ao meu lado,
sem seres real.

É como cantar-te a cor.
Desafinar em contratempo,
seja onde for.
Acertar,tacteando,
onde o cantar falhou.

É desabrochar-te a flor.
Mostrar-te o mundo,
sem pudor.
Tirar-te o medo do profundo,
sê-lo sem calor.

"Garota de Ipanema", Compact Jazz, Tom Jobim (Gil&Morellenbaum)

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Tango do vagabundo

Amaldiçoa a Milonga.
Passo curto,
volta longa,
olhar fortuito,
ponta a ponta.

Vira o barco,
segue a onda.
Acelera o passo,
alonga a ronda,
olha em frente,
gira de repente,
corpo colado,
respirar demente!
Pensar dormente,
corpo quente,
pásion ardente!

Mão gelada,
coração mudo,
gente calada,
cega para tudo.
Roçar de lábios,
loucos sábios,
amantes descuidados.
Olhares proíbidos,
sonhos desmedidos,
suspiros reprimidos!
No calor do respirar,
pausa no soar
do tempo a passar,
ninguém vê
para julgar.

E eis que se revolta!
Acorda a coragem
que parecia morta,
toma-a,selvagem,
nos braços da raiva solta,
beija-a num cruzar de pernas,
carícias ternas
e eternas,
na imensidão do segundo.

Retorna á balada,
de abalada,
para a realidade abandonada,
na certeza da loucura.
Perdidos na pura
paixão de um violino,
rendidos ao fino
rendilhar do piano,
a Milonga é só mais um porto seguro,
para os amantes
separados por um muro.

"Verano porteño" , The Central Park Concert , Astor Piazzolla

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Deveras cansado dos afazeres deste amargo mundo.

Assim me encontro e declaro,como se banido de um paraíso qualquer,num qualquer céu."Não mais que qualquer outra pessoa",digo eu para mim mesmo.E trabalhar tão perto do inferno pessoal da gente que polula pelo muy nobre Rossio á noite só torna mais real qualquer consideração deste género.

Ainda assim,os simplórios prazeres de estar vivo tomam conta de mim,dos meus olhos e dos meus dedos.
Tive o prazer de emprestar a uma foto semelhante a esta, este texto.Mostraram-ma,e perguntaram-me o que haveriam de escrever acerca dela.Eu não resisti.Penso que pode saír dali toda uma associação com futuro,ainda que a ideia não seja totalmente inédita.

Até lá,resta-me viver a solidão do horizonte,de um homem e da ponte que leva ao homem o horizonte.

"Muerte del Angel", The Central Park Concert, Astor Piazzolla

Cantar de fogo posto

O cheiro de lua nova
sopra-me no rosto.
Sem pressas de outra trova,
que a moda é como um fogo posto,
um cantar deposto.
Segue linhas e olhares,
corre ventos e lugares,
fugazes e sonolentos.
Abrevia-me o sofrimento,
torna lento o sentimento
de prazer por consumar.
Leve luz do ressoar,
breve grito mudo
a destoar,
negro Tudo
que fere o olhar.
O cheiro de lua nova
sopra-me no rosto.
Tudo se sente,
o que comprova
que o luar é um cantar deposto,
um doce canto do desgosto.

"Trains" , In Absentia, Porcupine Tree

terça-feira, 24 de junho de 2008

Sozinho na multidão

Eis-me aqui, numa encruzilhada de lugares comuns.

Primeiro texto em onda self-titled, como as boas bandas de antigamente; o nome, em si, é o reflexo do que tenho vivido na blogosfera, embora seja o mais provável destino de alguém que começa um blog: sozinho na imensidão de tipos que escrevem blogs. Mas creio que, sobretudo, é uma declaração de intenções, separar-me de um blog que marcou 4 anos e meio da minha vida, onde partilhei alguns dos meus mais profundos anseios e mais sentidos regurgitares de alma, com o pretexto de ser uma comunhão de grupo, quando na verdade tudo era quase igual. Quase. Chega de fotografias saudosas e deprimentemente alegres, deliciosos dizeres repetidos num dia-a-dia longínquo e celebrações de amizades ora efémeras, ora eternas. Chega disso tudo. Se estou e caminho sozinho, então declaro-me sozinho. No hard feelings.

"Unhealer" , Angl , Ihsahn